A prática aparentava ser simples: levar ao forno pedacinhos de matzá misturados no ovo batido até que ficassem secos, a ponto de serem cozidos no dia da ceia sem se desmancharem. Guardo na lembrança a imagem da minha mãe ocupada assando os caquinhos no ovo e a lembrança do som que eles produziam ao serem revirados no tabuleiro para que não grudassem. Isso se repetia a cada ano, e eu jamais poderia imaginar o quanto esse ato tão prosaico continha tanto significado.
Lá fui eu na minha segunda tentativa, desta vez, acompanhada de uma receita adicional com instruções mais precisas para que o resultado não fracassasse como na primeira vez. E foi assim que na intuição, na observação e na imaginação, eu passei horas assando os meus cacos, coisa que a minha mãe fazia em questão de uma hora. Hoje, se eu fosse relatar as virtudes da minha mãe, eu não falaria dos seus atributos de generosidade e bondade, mas sim dessa ação que ela realizava com tanta maestria.
A segunda receita dizia: secar ao sol. E foi o que fiz. Após longo tempo de forno, deixei meus cacos dourados expostos ao opaco sol de outono. Pareciam piritas cintilantes. Pontinhos de luz. Pela primeira vez, depois de tantos períodos de Pessach, hoje eu vi a possibilidade de uma ação tão banal conter tanta santidade.
Se eu fosse cantar o Daieinu para a minha mãe, eu começaria assim: "Se você tivesse feito só o ferfel, Daieinu, já nos bastaria."
Mãe, esse pré ferfel que fiz hoje, é em sua homenagem.